Daniel González e Wladimir: os heróis de uma infância lusitana

* Colaborou Leandro Paulo Bernardo

O futebol sempre me proporcionou momentos incríveis: histórias, amizades, heróis, alegrias. Entretanto, os últimos dias certamente vão antecipar a minha visita ao cardiologista.

Sempre guardamos com carinho um determinado jogador e o colocamos na seleção ideal de todos os tempos. Quando criança, via no Wladimir, o “Bárbaro”, um grande herói. Parecia o Conan defendendo nosso império rubro-verde, comandando a nossa zaga e coroando nossas batalhas com êxito – como aquele gol aos 47 minutos do segundo tempo contra o Palmeiras.

Graças às redes sociais tornei-me amigo dele no início desse mês. Logo recordei que, com nove anos, não sabia qual visual escolher na minha vida de adulto: a barba dele ou o bigode do Rodolfo Rodríguez. Hoje, depois de “ficar grande”, só me resta dizer: “muito obrigado, meu bárbaro, por ser um grande herói da minha infância lusitana”.

20986393_1523341711019196_584381816_n

Ainda falando em heróis, redes sociais e afins, recentemente tive uma madrugada de lágrimas. Proporcionei, porém, algo que vou me orgulhar para o resto da minha vida. Certa vez escrevi um texto sobre o inesquecível Daniel González e recebi um e-mail do filho dele, Marcelo González, agradecendo por recordar a história do zagueiro uruguaio.

Desde então, tornamo-nos amigos virtuais e sempre que vejo alguma matéria envio para ele. Em uma recente quarta-feira, o canal Bandsports exibiu um gol de Daniel González no programa “Gol, o grande momento do futebol”. Fiz uma pesquisa nos meus arquivos da revista Placar e descobri que aquele gol havia sido marcado no dia 6 de setembro de 1980, na vitória da Portuguesa contra a Ponte Preta.

20937901_1523341731019194_1299236671_n

Para minha alegria, o mesmo programa foi reprisado na madrugada da quinta-feira. Fiquei o tempo todo filmando com o celular em frente à televisão para registrar aquele momento. Com “o gol na mão”, até esqueci a hora e fui avisar o Marcelo. Perguntei se ele já tinha visto algum gol do pai, já suspeitando de uma resposta negativa.

Marcelo me disse que nunca havia visto um gol do pai, então enviei a minha filmagem com as legendas “então, verás agora”. Naquele momento, senti-me um mensageiro especial interligando um laço de amor interrompido precocemente, como também lembrei do meu pai e de quanto ele é especial em proporcionar alegrias e ter sido o meu primeiro herói.

 

Após ver o gol, Marcelo digitou “voy a llorar”. Sabendo o quanto aquele momento era especial, compartilhei com ele muitas lágrimas. Choramos juntos por algo inevitável, já que um dia “a separação” chegará em nossas vidas, mas concordamos que o amor entre pais e filhos supera qualquer limite físico ou explicável. Algo bem próximo do afeto que esses heróis proporcionam aos torcedores, que encontram em um determinado clube a essência infinita para a palavra “amor”.

Ao ir trabalhar na manhã seguinte, recordei do refrão de uma música do Green Day: “As my memory rests, but never forgets what I lost, wake me up when September ends” (Enquanto a minha memória descansa, mas nunca esquece o que eu perdi, Me acorde quando setembro acabar).

Como seria lindo se naquela noite cada filho recebesse uma visita especial em seus sonhos e que outros filhos conseguissem “acordar” em vez de ficarem desvalorizando algo que ainda tem. E que tentam perder por orgulho, desunião ou motivos tolos.

Para um futuro qualquer, talvez possa escrever junto com o Marcelo a linda história do Daniel González em um livro. Talvez um dia contarei aos meus netos o quanto Wladimir me fez acreditar em heróis reais e que meu pai era o chefe desses heróis ao ser o responsável por me introduzir nessa fábula sensacional chamada futebol.

* Leandro Paulo Bernardo – Cirurgião-Dentista, apaixonado por futebol, literatura e música desde os quatro anos, e com o coração dividido entre o Santa Cruz e a Portuguesa